quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Irmão Antônio Cechin habita a eterna esperança!

Neste dia 16 de novembro de 2016, aos 89 anos de idade, meu mestre e companheiro, carinhosamente o chamava de "Pai Abraão", passou a habitar a esperança eterna. As lembranças deste amigo que povoam minha memória são muitas. Compartilho algumas, em referência às facetas numinosas da vida.
O nascimento de nossa amizade, ocorreu nos primeiros anos da década de oitenta, junto as ocupações das vilas Santo Operários e União dos Operários. Desta amizade fui iniciado na "práxis da libertação" junto as CEBs - Comunidades Eclesiais de Base e aos movimentos sociais. Hoje, como vereador em que fui participe do processo de regularização destas vilas, recordo de um desafio que repetiu muitas vezes, em relação a estas duas ocupações, sendo a União dos Operários estruturada após a vitória da posse da terra em 18 de novembro de 1983: "Ivo, a União tem que ser nossa obra prima, pois o estágio de aprendizado foi com a Santo Operário". Aqui aprendemos a animar os pobres a se unirem em CEBs, organizando-os nos mais variados serviços que atendiam necessidades básicas: mutirão das mães, fornos comunitários, hortas caseiras e comunitárias, pastoral da criança, clubinhos das crianças, dentre outros; mas também a acompanhar a militância nas associações de moradores, nos sindicatos e no  Partido dos Trabalhadores; sem contar, na organizações da Associação dos Carroceiros e Catadores, a Associação Colonos-Operários e a Associação da Horta Comunitária União dos Operários.
Foi ele que me fez ver a importância, logo após licenciar-me em Teologia na PUC/RS, a formar uma pequena casa de frades com tempo integral voltado a assessoria pastoral que perdurou por mais de uma década:  a Comunidade Santo Dias, na Rua União, na Vila Natal, em Canoas. Iniciamos esta casa, da qual convivi por dois anos com meu mano, Frei Egídio Fiorotti e o Frei Wilson Dallagnol. Minha tarefa pastoral era no campo da CEBs - Comunidades Eclesiais de Base; a do Egídio, na PO - Pastoral Operária; e  a do Wilson na CPT - Comissão Pastoral da Terra. Convivíamos alguns dias específicos no mês, orando e refletindo nossa práxis; o restante do tempo andávamos como ativistas na base, assessorávamos encontros em nível estadual e nacional, além de mantermos presença na reunião mensal no ECORES, uma instância de assessoria da Regional SUL3 da Conferência Nacional dos Bispos de Brasil, no RS. Foi uma rica experiência de refletir sobre a práxis e partilhar reflexões com expoentes da TdL- Teologia da Libertação.
Olívio Dutra vencia as eleições em Porto Alegre em 1988. Ir. Antônio, convenceu-me a radicalizar e iniciar mais uma casa de inserção, agora na Ilha da Pintada, para atuar com os Catadores, em especial nas Ilhas  do Pavão, Marinheiros e das Flores. São muitas as lembranças nesta desafiadora  tarefa de convencer os catadores a trabalharem coletivamente. Usávamos como atrativo  o lixo reciclado captado junto aos fiéis de paróquias e estudantes nos colégios do centro de Proto Alegre.  Os catadores despertavam esta solidariedade contando suas vida nas aulas e nas missas. E eu, pra variar, tinha a nobre tarefa de ajudar a coordenar esta façanha, mas também de dirigir o caminhão que coletava o lixo. Pra descansar um pouco, tínhamos um barco e fazíamos passeios fortuitos pelo Delta do Jacuí com suas 33 ilhas e ilhotas. Em minha memória, ainda vivem lapsos de imagens das inúmeras aventuras com o barquinho, descortinando a beleza da paisagem, em uma tarde de verão e, de vez em quando, desencalhando aquela pequena nau nos bancos de areia que se formavam nas pontas das ilhas.
Abriu-me as portas junto com outros religiosos e leigos para participar de espaços nacionais como na ampliada das CEBs que articulavam os Interecleisias, no CESEP com seus cursos de verão em São Paulo,  no CEBI com suas jornadas de formação aprofundando a leitura popular da Bíblia e em tantos outras instituições de apoio as lutas populares. Com seu aval, estive frequentando por quatro meses um seleto grupo de militantes, trocando experiências de nosso engajamento nas mais variada formas de luta pela libertação na América Latina. Neste período, conheci o curso de Sociologia da Religião no IMS - Instituto Metodista Superior em São Bernardo do Campo/SP e convenci meu superior  provincial e a equipe da ESTEF - Escola de Teologia Franciscana, de que não era preciso ir para a Europa para realizar meu Mestrado em Sociologia. Ele ficou um pouco decepcionado com minha decisão de atender mais as necessidades da província em ter um professor para a escola do que um agente de pastoral para as CEBs. E, em 1991, quando decidi deixar a vida religiosa, notei  nele mais uma pequena frustração. Mas não deixou de ser solidário, no início de 1993, emprestando-me hum mil dólares para adquirir minha primeira casinha, no terreno  em que os moradores da Vila União dos Operários me acolheram. E assim seguem tantas e tantas rememorações. A última foi na celebração da missa de sétimo dia do companheirão e sempre vereador Oli Borges, na Comunidade Jesus Operário, na vila Santo Operário, em canoas. Ele chegou no início da celebração e o Frei Wilson Dallagnol que estava presidindo, oportunizou-lhe a palavra para uma breve reflexão. Ele discorreu sobre a certeza da ressurreição, como a libertação definitiva para o encontro com o divino. Recordo de suas deixas, quando referiu de que não havia chegado sua hora e que o Oli com 30 anos a menos que ele, havia realizado este feito, encorajando-nos nesta esperança numinosa da vida.  Mal sabia ele que, em menos de um mês, concretizaria esta experiência divina. Antônio Cechin sempre vivo e presente, ressurrecto;  e, cada um de nós que teve o privilégio de conhece-lo, com as lembranças a serem revividas em nossas memórias!

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